quinta-feira, 29 de março de 2012

O Céu Vestido de Negro


Andava com o cavalo cor de pérola pelo jardim, de chão prateado e trigos de ouro onde o pensamento residia no galopar do cavalo. O mundo tinha-se tornado cruel, materialista e sem escrúpulos, onde o romantismo perdeu lugar e se tornou para os fracos. Um mundo onde a ignorância reside nas faces da população que habita o mundo que durante séculos foi chamado de planeta azul, onde agora apenas se vê cinzento e preto nos céus de quem tem coragem de erguer a cabeça ao ar.
Enquanto cavalgava pela quinta antiga com já dois séculos de história, pensei, pensei como a população se tornou materialista e egoísta. Senti-me revoltada com a sociedade que antes nascera do afecto e carinho dos progenitores e protecção dos pais e Tudo o que era puro e naturalista se tornou no que hoje se vê num olhar pela janela da sala. Tudo o que cabia á inspiração foi ocupado pela negação do belo, onde a rivalidade tomou lugar ao amor e inocência de quem o habitava, tudo aquilo que tornava uma cidade alegre, está agora degradado ao tornar um céu azul num negro que mata qualquer olhar belo de um humano.
Hoje, onde a força me escapa das rédeas do cavado ao galopar, escapa-me também a força da mente para contestar contra este mundo de pessoas robóticas. Eu, apesar de já velha, ainda faço parte dos fracos que se encantam pelo romantismo e pelo belo das esculturas greco-românicas, onde cada curva era maravilhosamente delineada e esculpida, ao contrário deste mundo de meros parasitas da robótica que se chamam de humanos.
Mariana Ramos Maia

domingo, 25 de março de 2012

A Carta sem voz nem receptor


Berlim, 2 de Setembro de 1942

Hoje vagueava pela rua da minha casa, no largo do grande muro de Berlim. Quanto mais me aproximava, maior era o ruído do desespero vindo de dentro, das pessoas. O ar era marcado pelo cheiro da morte dos que lá permaneciam, como estátuas da antiga Grécia, impossíveis de se tocar.
Ao longo do muro vejo os sacos abandonados, testemunhos da morte dos fugitivos que, ao porem o pé no outro lado, são espancados e levados pela morte, à frente dos que fingem que nada sabem e dos que fingem que nada veem, como se a ignorância fosse mais fácil do que a luta. Eu era um deles, fingia não saber e não ver a morte dos que não pertenciam à nossa etnia, os que eram morenos e de olhos castanhos doces, como um chocolate acompanhado dum reflexo que encontramos quando bebemos uma caneca de chá, verde claro, reluzente. Foi então que os meus olhos mudaram de direção. Olhei em frente e vi-te, alto como a árvore da vida e magro como um ramo frágil que suporta o ninho e o lar de quem lá vive. Olhos castanhos reluzentes. Fugi, não aguentei o sofrimento que trazias nos teus olhos, a dor da tua boca marcada de sangue e carne viva.
Regressara ao meu quarto. Sentada na poltrona, de máquina de escrever à frente, escrevi, escrevi até o barulho da rua se dissipar com os meus pensamentos e com o barulho das teclas a bater no papel e a marcar cada letra, cada palavra, cada sentimento de revolta e angústia dos que sofriam e dos que por egoísmo, tudo tinham, tudo ambicionavam e nada faziam. Naquele momento mudara de rumo na minha vida, dedico-me a ti, Amor, nome que te dei, pelo simples facto de o Amor ser a metáfora da minha vida.
Assim, esta carta termina, sem destinatário e sem rumo, sem voz de leitor e reação de recetor. É a carta que prova que tu existes e que a minha forma de pensar mudou, por ti e por todos os que se encontram como tu, em dor constante. Em medo do que está apenas ao virar da esquina, a morte.

Para ti, Amor.
Alanor.